A sustentabilidade e o reporte de desempenho ESG: do ‘Relatório Bruntland’ ao ‘Programa Empresas Turismo 360º’ do Turismo de Portugal

O ESG sintetiza os processos de reporte de um conjunto alargado de indicadores de desempenho que permitem demonstrar o nível de compromisso de uma empresa com a sustentabilidade ambiental, a consciência social, a ética e transparência da gestão e, ainda, com o cumprimento da legalidade do licenciamento, do funcionamento e das atividades operacionais. A sigla ‘ESG’ traduz as expressões em inglês ‘Environment’, ‘Social’ e ‘Governance’, que enunciam a conduta e as práticas ambientais, sociais e de governança corporativa adotadas pelas empresas, e que são expostas num relatório apresentado publicamente a todos os stakeholders.

A primeira referência a esta terminologia foi introduzida no relatório “Who Cares Wins”, apresentado em 2004 pela International Finance Corporation do Banco Mundial, o qual foi produzido em linha com o Pacto Global da ONU – uma iniciativa lançada em 2000, com o objetivo das empresas em todo mundo alinharem as suas operações e estratégias com os Dez Princípios Universais nele enunciados, nomeadamente para as áreas dos direitos humanos, do trabalho, do meio ambiente e da ação anticorrupção. A essência subjacente à identidade do modelo ESG foi moldada em iniciativas pioneiras de consciencialização para a mudança de paradigma do desenvolvimento sustentável, social e corporativo, como a CSR – Responsabilidade Social Corporativa (1953), o SRI – Investimento Socialmente Responsável (1970), o GRI – Global Reporting Iniciative (1997), o Triple Bottom Line – Três Pilares da Sustentabilidade (1998), o CDP – Carbon Disclosure Project (2000) entre outros.

Neste sentido, para além da dimensão ambiental, que remete para a transição verde e para a descarbonização, o reporte ESG abre espaço para as empresas apresentarem o seu desempenho social e de governança. Trata-se de uma forma de medir o desempenho global da sustentabilidade de uma organização, fornecendo informações muito relevantes para os acionistas, para os novos investidores e para um conjunto alargado de pessoas, entidades e outras empresas, como por exemplo os trabalhadores, as entidades reguladoras do setor, as entidades gestoras do território ou a própria comunidade, que reside na zona envolvente às instalações operacionais da empresa e que é, naturalmente, impactada pela sua atividade.

Decorrente da gradual adoção do reporte ESG, há novos temas, transversais a todos os setores da atividade económica e, consequentemente, do turismo, que vamos ouvindo falar cada vez mais no mundo das organizações. É disso exemplo a consciencialização e a responsabilidade com os direitos humanos e as desigualdades sociais no ambiente de trabalho, os imperativos da ética e da transparência empresarial, o ‘green finance’ (o financiamento verde), o ‘due diligence’ (diligência de verificação) ou o ‘compliance’ (conformidade legal), entre outros.

Apesar de novos para a maioria dos negócios, estes temas marcam a agenda das grandes multinacionais e das empresas cotadas em bolsa em todo o mundo há vários anos. Na verdade, a sustentabilidade é um tema debatido há mais de 30 anos, nomeadamente desde a apresentação do relatório de Bruntland em 1987 (Our Common Future). Desde então, outros temas ficaram definitivamente na agenda das organizações e das empresas, sobretudo com as conclusões e metas inscritas na Agenda 2030 da ONU, que enumerou os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), subscritos pela maioria dos estados-membros no decurso da Cimeira do Rio em 2015, no Acordo de Paris para as alterações climáticas, firmado em 2016, e ainda no Pacto Ecológico Europeu, constituído em 2019, e que procura estabelecer as metas da neutralidade climática do continente europeu até 2050.

O ESG pressupõe uma transformação da atuação das organizações que vai muito além dos investimentos em soluções de ‘energia verde’, de mitigação da pegada do carbono ou das iniciativas que impactam positivamente a comunidade em demonstração da responsabilidade social da empresa. Assim, com o intuito de sensibilizar o mercado para a importância de transcender a avaliação puramente financeira das empresas e considerar, com igual importância, as ações que refletem a responsabilidade ambiental, social e corporativa das instituições, o ESG traduz uma nova postura de transparência e atuação das organizações, que irá impactar os modelos de negócio, a definição de produto, ou mesmo a capacidade das organizações obterem financiamento para expandir a sua atividade. Este introduz também um novo conceito de materialidade que proporcionará às organizações a capacidade de quantificar, medir e comunicar, tanto interna, como externamente, junto de stakeholders, colaboradores e consumidores, o seu compromisso, proatividade e impactos relacionados com questões ambientais, sociais e corporativas.

Como tal, durante a última década, verificou-se uma tendência crescente na implementação do reporte ESG no seio das empresas e instituições, o que se explica pela ocorrência de emergências climáticas cada vez mais impactantes, pelo incremento das crises humanitárias, pelo crescente nível de consciencialização para a eliminação dos modelos de negócio que estimulam a produção e o consumismo massificado e insustentável, ou ainda pelo surgimento de diversas iniciativas que estimulam as empresas a adotarem novos hábitos e compromissos para com a sustentabilidade.

Atualmente, a consciencialização em torno da necessidade de adotar metodologias de reporte dos impactos e ações ligadas à sustentabilidade está cada vez mais consensualizada entre governos, investidores, stakeholders e empresas, sendo que os standards e conformidades do relatório de sustentabilidade desenvolvidos pela Global Reporting Initiative (GRI) constituem uma das principais referências mundiais neste âmbito. Há uma variedade muito grande de empresas, investidores e até governos que baseiam os seus relatórios nos standards da GRI, representando um avanço significativo na consensualização global da estrutura, parâmetros, temas, materiais e indicadores ESG a reportar, que incidem sobre temas tão diversificados como os impactos relacionados com alterações climáticas, os direitos humanos, a conduta corporativa, o bem-estar social, entre outros indicadores.

Importa ainda mencionar as Normas Europeias de Relato de Sustentabilidade (ESRS), o primeiro aglomerado de normas europeias para o reporte ESG das empresas, que consiste em doze normas transversais, lançadas com o objetivo de definir um quadro de referência comum para as empresas efetuarem o reporte dos seus desempenhos em matéria de sustentabilidade no espaço europeu. Na sequência das ESRS, surgiu a Diretiva (UE) 2022/2464 do Parlamento Europeu e do Conselho de 14 de dezembro de 2022 para a comunicação de informação sobre a sustentabilidade das empresas (CSRD). Esta é a mais recente diretiva europeia direcionada para a elaboração do reporte associado à demonstração dos riscos, oportunidades e impactos ambientais e sociais decorrentes da atividade empresarial. Prevê-se a entrada em vigor da diretiva a partir deste ano fiscal de 2024, sendo destinada às grandes empresas (mais de 250 colaboradores) ou às empresas cotadas em bolsa (exceto microempresas).

Esta medida está inscrita no Decreto Lei n.º 89/2017, de 28 de julho, que transpõe a Diretiva nº 2014/95/EU para Portugal, e que impõe a obrigatoriedade de reporte das informações não financeiras. Esta obrigatoriedade – de aplicação transversal a todos as atividades económicas – começa a vigorar para as grandes empresas a partir de 1 de janeiro de 2024.

Tendo em conta esta imposição legal e compreendendo que o setor do turismo em Portugal é composto essencialmente por PMEs, que demonstram muita dificuldade em apresentar planos de ação e relatórios para a sustentabilidade, o Turismo de Portugal desenvolveu o Programa Empresas Turismo 360º para fomentar e apoiar as empresas do setor do turismo a implementar práticas de reporte ESG.

Esta iniciativa tem como objetivo promover as diretrizes da sustentabilidade para a cadeia de valor do setor do turismo em Portugal, dinamizar ações de capacitação de gestão ESG junto das empresas, agentes e stakeholders e estabelecer um modelo global de medição e avaliação do desempenho ambiental, social e de governação das empresas alinhado com os 17 ODS da Agenda 2030 e com o Pacto Ecológico Europeu. Este programa faculta o acesso a uma plataforma digital – a ‘Forest’ -, que facilita o processo de reporte, análise e monitorização dos dados e indicadores ESG, a partir dos quais pode avaliar a evolução das métricas estabelecidas para a sua empresas, em particular, e para o setor na generalidade, o qual iremos abordar mais em detalhe num próximo artigo.

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